quarta-feira, 11 de maio de 2016

mulher, objeto de cama e mesa - heloneida studart [ou: como uma resenha virou depoimento? (Isso não é uma resenha)]

Minha mãe me deu esse livro ano passado, quando a disse que produziria um projeto de pesquisa para faculdade com a temática sobre a desigualdade feminina nos cargos de poder. Se esse livro fala sobre isso? Um pouco.
O que esse livro realmente retrata é, em diversos pontos, sobre a desigualdade de tratamento e, portanto, de evolução da mulher e do homem. O ponto central é de que as mulheres não são incentivadas a trabalharem seus cérebros - como os homens são - porque estão condicionadas a vida doméstica no qual pouco são exigidas.
"A psicogenética (Piaget) demonstra que a idade mental da mulher doméstica varia em torno de 8 anos. Em resumo: a mulher é retardada. Levam-na a tratamento de reabilitação, como fazem aos excepcionais? Não. Oferecem-lhe o consagrado papel de rainha do lar. E lhe dizem que não mude." ( pág. 8)
Nesse trecho acima ela ressalta o condicionamento feminino ao retardo mental - não de forma doente, como se houvesse diferenças biológicas e fundamentais entre os cérebros feminino e masculino, mas de forma social. Com as diferentes formas de criação, a mulher cresce visando um único modelo de vida: aquele em que ela poderá exercer o papel de mãe, esposa, dona de casa. Aquela que tem como principal preocupação qual receita preparar para o jantar. E não porque esse é o real desejo feminino ditado pelos hormônios, neurônios, ou que quer que seja; mas porque esse é o papel feminino valorizado na sociedade. Essa é, assim é ditado pelos meios de comunicação, a forma de ser uma verdadeira mulher. Assim Heloneida dispõe em outro momento:
"O Dr. Jerome Kägan, psicólogo de Harvard, observou estranho procedimento nas crianças nascidas em São Marcos, vilarejo situado nas montanhas da Guatemala. Durante os primeiros anos de sua vida, elas são deixadas ao abandono, no escuro, nos cantos mais escondidos dos seus casebres. Ninguém lhes dirige a palavra, mesmo à hora de serem alimentadas. Ninguém as encoraja a qualquer participação na vida comunitária. Não são chamadas à ação para nada. Tornam-se apáticas, custam a aprender a falar ou a mover-se e com dois anos parecem pequenos fantasmas. 
O Dr. Kägan chamou a atenção dos cientistas para o fato, salientando que, se o cérebro não recebe os estímulos apropriados, entra em processo de retardamento, difícil de ser recuperado. 
A defasagem das mulheres em relação aos homens vem de processo parecido. Menina, deixam-na em casa, com a convivência mais ou menos infantilizada da mãe e da empregada. Só lhe despertam a atenção para insignificâncias: o vestidinho novo, o laço do cabelo, a pulseira da vizinha. Ninguém lhe acena com as aventuras da Ciência ou com as alegrias da inteligência. E é como se lhe dissessem, desde muito pequena: deixa para os machos a medicina, a geofísica, a astronáutica, a matemática pura, a arte - vai ser rainha do lar.
Quem pode culpar as mulheres de não serem racionais, de cultivarem uma espécie de confuso pensamento mágico, que as leva a confundir as histórias das telenovelas com a realidade? Se elas viveram sempre mais ou menos no escuro, como os bebês guatemaltecos, não é natural que se mostrem apáticas e sem discernimento, temerosas de tudo o que não compreendem - sobretudo as transformações históricas?"
A citação é longa mas vale a pena. Nela ela destaca esse condicionamento feminino desde o nascimento - e não é que faz sentido?
Na introdução, feita pelo Lauro de Oliveira Lima, ele descreve Heloneida como alguém que 'tem credenciais especialíssimas para escrever sobre mulher, apesar de não ser uma <feminista>, no sentido político do termo' e sim 'apenas uma mulher moderna que conseguiu resolver os problemas da situação feminina'. Ele a caracteriza como, além da jornalista e romancista que foi, como uma 'mãe exemplar'. Também a descreve como uma escritora que não tende a 'radicalizações' - e que seriam essas tais radicalizações?
No livro, Heloneida opina que o problema (da desigualdade) não está nos homens, e sim no sistema. Não são os homens que são opressores e sim o sistema. Com uma visão, chutaria eu, que marxista do feminismo e da desigualdade, ela diz que enquanto o nosso movimento se concentrar em queimas de sutiãs, nada teremos - nenhuma igualdade, nenhuma evolução. Existem assuntos mais sérios a serem tratados. E com isso eu concordo, pelo menos com essa última afirmação. Com isso, tendo eu a acreditar que o autor a classificou como uma escritora sem radicalizações exatamente por não 'culpar' os homens. O quê, aí sim, eu já não concordo.
Pros homens o feminismo, a evolução e a independência da mulher são aceitáveis até o momento em que as elas mexem no papel que as foram dadas anos atrás - ou seja, tudo bem trabalhar, ganhar o mesmo que os homens, serem produtoras de conhecimento, chefes de empresas, com vida sexual ativa e com roupas bem menos 'recatas' que as eram impostas DESDE QUE isso não as impeça de serem também donas de casa, mães, educadoras em tempo integral dos filhos, magras, bem maquiadas e com apetite sexual interminável.
Acrescentar? Tudo bem. Agora, editar o seu papel ao ponto em que seus 'deveres históricos' não mais existam nessa nova vida é inadmissível - e é aí que começa a guerra.
Termino com a melhor citação que pude retirar do livro.

"A mulher é um objeto sexual. Ao dizer isso, Betty Friedan recebeu, como resposta, uma onda de injúrias: Feia! Frustrada! Sem dúvida, a escritora americana é muito feia. Freud também era, Einstein tinha uma cara horrível, mas ninguém se recusou, nunca, a ouvir as suas ideias por causa disso. Não se está querendo comparar Betty Friedan com esses dois gênios, o que seria ridículo. Mas uma coisa é verdade: a mulher é o único ser racional que precisa abonar as suas teorias com um rosto bonito ou um belo par de pernas."



Nenhum comentário:

Postar um comentário